Às vezes, muitas vezes, tantas vezes
EU SOU A PESSOA MAIS SOZINHA DO MUNDO.
Mesmo com família fisicamente próxima e tanta gente boa
virtualmente à minha volta. Como se todo o universo ao meu redor se desintegrasse,
e eu à deriva num buraco abissal todo cheio de nada, uma escuridão profunda, vazia
e dilacerante.
Tem gente linda sim me acolhendo, todos essenciais no seu
jeito tão verdadeiramente amoroso de me dizer o quanto eu sou maravilhosa e
merecedora de coisas boas e belas, e eu acredito em cada um porque no fundo eu
ainda sei que sou. Eu ainda acredito em mim, acreditem. Ouvi dizer mais de uma
vez que sou amada, e que onde quer que eu pise nesse mundo desperto bem-querer
nas pessoas de bom coração. Me foi dito isso, e não há de ser força do mero
acaso. Porque eu vivo, eu sempre vivi, sob a égide do amor, e esta proteção
nada nem ninguém na vida há de me roubar!
E saber disso tá muito longe de ser pouca coisa. A bem da
verdade, no meio desse vazio abissal, talvez isso seja o fio suspenso no ar no
qual ainda venho me equilibrando nessa teimosia de me manter fiel à vida,
apesar de tudo. Mesmo as mariposas em constante revoada em meu estômago que às
vezes tornam-se furacões que me arrastam pra tão longe a ponto de eu
mesma acabar me perdendo de mim.
Há quem creia que eu não deva expor minha tristeza e nem
falar em meus textos tão abertamente da minha solidão. Que de repente isso me enfraquece.
Olha, talvez, talvez vocês tenham razão. De repente sim. Talvez eu devesse usar mais meu alter-ego nesse momento, como escudo protetor, ser terceira pessoa. O vampirismo emocional
pode ter lá seus canais online também né. Mas não, hoje não. Hoje não consigo. Hoje precisa ser eu a me desnudar, e nada mais. Talvez essa escrita frenética dos
meus sentimentos mais profundos seja efeito do isolamento, da ausência do
carinho, do abraço, do afago, do chêro no cangote, do toque, da conchinha, da vida social, essas coisas que
nós, os “cerumanos”, costumamos, na maioria dos casos, não só gostar, mas
precisar mesmo, saca?
Mas talvez o que
enfraqueça mais a gente seja a vontade de gritar e só encontrar ao redor as
mesmas malditas quatro paredes fazendo esse grito ecoar de volta pra gente
mesma. Esse grito encapsulado numa urna de cristal, tão cheia de elegância
quanto de fragilidade. E um sorriso de palhaço pintado na máscara que eu vesti
hoje de manhã pra emular felicidade. Desculpa incomodar o silêncio da sua
viagem. Tira a sua quarentena egoísta do caminho, que eu quero passar com a
minha dor. Eu ainda tô lambendo as feridas do meu orgulho e do meu coração, mas
só porque aprendi com os bichos que a saliva cicatriza. E com a meditação
também aprendi que ego é tudo aquilo que você tem que abandonar pra descobrir o
seu eu mais profundo e verdadeiro. Que mesmo que você nunca descubra, a jornada
já é mais importante e essencial do que o quer que exista no final desse
caminho.
A verdade é que eu já reprimi meus sentimentos tantas vezes
nessa vida que hoje o que eu sinto mesmo é necessidade de transbordamento. Meu
sofrimento é mesmo cheio de som e fúria, de medo e delírio – e uma dose de masoquismo, como um
licor amargo que eu vou tragando em golinhos dolorosos. Talvez só com terapia mesmo eu
aprenda a nunca mais permanecer neste lugar por tanto tempo, que não que eu não
possa passar por ele – mas é pra ser de baldeação, nunca pouso permanente.
Deusas e deuses, tenho certeza que daqui a algns anos certamente vou me reler e provavelmente rir da minha capacidade de
ser tão dramática. Como aliás, já fiz outras vezes. Talvez eu possa jogar a a culpa nos astros se um dia me esfrorçar um pouquinho mais pra entender algum tipo de mensagem que há no céu do meu nascimento. Pensando agora, este parece um
texto triste, mas paradoxalmente também não parece.
Há ainda alguns momentos, espalhados pelos dias, em que me
sinto, por algum motivo qualquer, inexplicavelmente bem. Quando danço ou canto
sozinha, livre e espontaneamente, como hoje na cozinha ouvindo Madonna e
preparando a comida. Por breves instantes quase chego a introjetar em minha
alma de forma irremediável a verdade de que um dia terei asas pra voar
novamente. Neste momento, porém, junto a todo esse incômodo sinto muita dor nas
articulações dos calcanhares, um resquício de uma chicungunha que alguns anos
atrás nem foi tão forte assim, mas pelo visto deixou seu legado, obrigando a me humilhar usando uma pomada feita de uma erva chamada "canela de velho". Vida, chega de ironia, tá bom já. Já deu. Já não me basta ter sofrido de uma doença chamada "chicungunha"?
Pisar no chão tá doído, talvez porque tô pisando
nos meus próprios cacos espalhados no assoalho. Assim como ainda doem as
feridas abertas das asas cortadas (talvez por mim mesma?!), dor de assum preto,
blackbird, black raven.
Quase sem querer, invoco Paul a sussurrar em meu ouvido, com
ternura melodicamente fúnebre: “Take these broken wings and learn to fly”.
Quase sem notar, invoco Belchior, que amar e mudar as coisas nos interessa mais, cantarolando em minha cabeça: "No presente a mente, o corpo é
diferente, e o passado é uma roupa que não nos serve mais”.
E o futuro ao infinito pertence.
(imagem: Chiara Bautista, minha amada Milk)
#Carentena
#Carentena
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Um comentário:
Está libertando sua alma e aprisionando sua carne.
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