terça-feira, 23 de março de 2021

APOCALIPSE DISTÓPICO-PANDÊMICO - SOBRE A SOLIDÃO, ISOLAMENTO E DEVANEIOS AFINS


 Pessoas não podem viver aprisionadas assim. Ninguém deveria viver encarcerado, inclusive dentro da própria mente, do próprio ego, essa grande bola de ferro que nos prende à superfície e nos impede de voar. Tipo assum preto cazasinha cortada, é nóis.

Tá tudo bem. Tá tudo bem. Eu repito sempre pra me convencer que tá tudo bem. Só tem uns dias que são mais difíceis que os outros. Um dia após o outro, um dia de cada vez. Dizem os mantras, os astros, conselhos, se dane o evangelho, garantem os orixás. Mas é a montanha-russa, tá ligado?! Ela não para nunca, é uma porra dum Snowpiercer sem o high tech, só o teco-teco mesmo (sem spoilers, fazenufavor, ainda não vi a temporada nova). A vida no agora é a montanha-russa do Tivoli com 1001 carrinhos e geral segurando o fôlego antes daquele loop onde a gente vomita igual a mina do Exorcista, e ainda por cima vomita rosa de tanto picolé Frutilly que bem que minha mãe dizia pra não comer tanto, mas eu sempre comia. Sempre contestando autoridade. O loop onde o mundo vira de ponta-cabeça de vez, onde a vida capota mais que Katamari, porque ele vem, ah meus amores, ele SEMPRE vem. A voz do anjo sussurrou no meu ouvido: “enche o pulmão de ar, filha da puta! LABAXÚRIA CANTARARAMÁS!” (confesso que essa última parte eu não entendi). Mas é resistência que chama?! Ou é subsistência?

Quando vc não sabe mais a diferença entre vertigem e tédio — ou quando sabe até demais — é porque a montanha-russa tá indo bem mais rápido do que você é capaz de suportar. Mas mesmo assim você é capaz. Engraçado isso, né?! Você tem que ser. Nessas horas você se descobre capaz de coisas que nunca imaginou. Tipo andar na corda bamba segurando uma sombrinha numa mão e rodando um prato em cima de um pauzinho na outra. E que se pá você nem gostaria de ser capaz de tanto malabarismo, mas tem outro jeito?!

Tipo contar os dias, mesmo sem saber quando termina, e ainda assim continuar contando e crendo que sim, tudo é passageiro — menos o motorista e o cobrador (sim, Tio do Pavê, me deixa que hoje eu não tô inspirada).

Nenhuma interação virtual substitui de verdade um abraço, daqueles que te envolvem e dão um quentinho no coração, aquela vontade de morrer naquele abraço, saca?! O toque, o calor e a textura da pele. O cheiro. Cês sabem exatamente do que eu tô falando.

Sabe o tipo de coisa que a gente valoriza real quando fica escassa? Pois é. Quando a gente tem pouco e queria ter muito, e eu tô falando de sentimento, de afeto, de calor humano, não é de dinheiro não. Dinheiro só é importante porque é com ele que a gente compra drogas, viaja pra lugares paradisíacos e come sushi. Quer dizer, no mundo ideal né, porque no mundo real pra muitas pessoas só da pro feijão com farinha mesmo e olhe lá. Um maço de G comprado no trem (“mais de 4700 vitaminas para o seu pulmão”), uma Caninha da Roça, barrigudinha.

Pedaços de papel coloridos com números impressos definindo o tempo todo quem vive e quem morre. Definitivamente, esse mundo não é para amadores (com duplo sentido, por favor). “Fuck this shit, I’m going to Narnia” — mas do outro lado do armário só tem mesmo um compensado vagabundo cheio de cupim e traça cheirando a mofo e naftalina. Ser adulto dói.

A gente viajava. Agora a gente só espera. E vive um dia de cada vez, mesmo sendo um eterno dia da marmota.

Nunca na vida eu imaginei que usaria tanto, pensaria tanto, e principalmente sentiria tanto uma certa palavra, um conceito. Em todos esses anos nessa indústria vital, eu nunca imaginei que uma palavra tão triste e bonita, privilégio de lusófonos, ia ser ressignificada pra caber dentro dela todo esse turbilhão que eu sinto e sou agora.

MUITO PRAZER, MEU NOME É SAUDADE. 

(Trilha sonora: American Heads, Flaming Lips. Deve ser patológico esse lance de achar a coisa mais linda quase tudo que é melancólico)

#carentena #adamavagabunda #mulheresqueescrevem #demasiadohumana

segunda-feira, 1 de março de 2021

Céu


Céu lindo e poderoso
que finda tardes melancólicas
E anuncia anoiteceres
não menos melancólicos.
Os dias se sucedem
Já nem sei que dia é
Me perdi no calendário
da apocalipse nau.
Meu céu particular
Explode sobre a chaminé
Sobre as telhas cansadas
Emoldurado por grossas paredes
Duras, frias, seculares.
paredes que nem sempre confortam.
Paredes que fazem de mim
Mais confinada
que acolhida...
Mulher cheia de vida encarcerada.
Mesmo assim, mesmo ainda,
consigo achar uma beleza (meio triste) nas coisas.

#carentena #adamavagabunda #CéuParticular #mulheresqueescrevem


sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Um recado de mim do passado pra mim do futuro

Hoje não me recolho

À minha suposta insignificância

Não me encolho pra caber no sonho de alguém 

Como quem não sabe amar.

Ao contrário 

me expando

Explodo

à minha imensa significância

Ressignifico a distância

amalgamando

saudades

Amando


Meu constante desafio:

Me re-apaixono por mim mesma a cada instante.


Dito assim parece fácil

Parece um fio

Suspenso no espaço 

mas em meu sótão habitam

uns 4 mil fantasmas

Embora tenha medo do futuro

Muito mais que de almas penadas. 


então apenas

Viro pena

Viro pluma

Viro folha

deixo estar.

Permito ao universo 

seguir seu fluxo

E que ele me permita

nunca desistir

de ser livre

Que ele nunca me permita 

desistir

De ser leve

E que ele me permita 

nunca desistir de amar 


Que ele apenas

me leve

Ao sabor de uma brisa

Que cheira a sol 

Vento

Sol

Lar


(escrito em julho/2020 - arte por Pixie O'Harris #carentena #adamavagabunda)

sábado, 7 de novembro de 2020

Sonhos V (ou sei lá, perdi a conta)

 


Eu e Godinho éramos sobreviventes do apocalipse zumbi. Andávamos por aí em um grupo errante de sobreviventes, ceifando a vida de zumbis famintos e lutando contra outros grupos de humanos sobreviventes, enfim, o dia a dia de um apocalipse zumbi normal. Em um dado momento de muita adrenalina eu vi um amigo e pensei que ele estivesse ferido, mas quando me aproximei percebi, a tempo de conseguir fugir, que ele estava zumbificado e era tarde demais para salvá-lo. Ufa, essa foi por pouco. Nosso grupo então achou um ônibus e fomos embora nele. Nesse ônibus notei que a Lia tava sentada atrás da gente. Sem mais nem menos o ônibus pára e entram dois sujeitos, com sotaque nordestino, vendendo chapéus de palha (aparentemente ainda existia dinheiro e ele ainda valia alguma coisa. Chapéus de palha também). Mas calma aí, isso não é o mais absurdo. Não eram chapéus de palha comuns, daqueles que poderiam de repente ser até úteis numa situação dessas, pra proteger do sol e tals. Eram uns chapeuzinhos pequenos, mega-fofos, e umas casquetes lindinhas! A Lia comprou um muito bonitinho com a abinha irregular virada pra cima, e eu peguei um que parecia um mini-chapéu de chinês, mas com umas pérolas bordadas e uma pluminha branca. Aí eles falaram "mas o melhor está aqui" e abriram uma caixa onde tinha um montão de enfeites de cabeça, casquetes, fascinators, etc. "Olha esse aqui", e pegaram um alfinete de chapéu com um coelho estilizado super art decò (seria uma participação especial da Aline Coelho?!) e era a coisa mais linda do mundo! Tudo era super barato e compramos muita coisa! E por um momento até esquecemos que o mundo estava infestado por um vírus misterioso que transformava humanos em aterrorizantes zumbis sedentos de sangue.

MORAL DA ESTÓRIA: DIVAS SÃO DIVAS. Elas tem que divar, no matter what.

Boa noite.  

Arte: Zombie Pin Up de Rob Sacchetto 

sexta-feira, 23 de outubro de 2020

 



Alma

convulsão

 

A vida é tão maior

E além

dessas quatro paredes

que me cercam

e me encerram em mim mesma

bem mais do que eu gostaria.

Encerram meu corpo

(E a alma em convulsão)

 

Confesso que o que tenho mais saudade

é dos abraços

Mas também tenho um medo danado

De não conseguir mais me soltar no mundo

De me fechar pra sempre nesse universo de brancura infinita

Paredes branco gelo, gélido concreto

Inferno de Sartre

Só que os outros moram TODOS dentro de mim

Que prendo eternamente na garganta

esse grito impossível.

 

Mente

confusão

 

Já há algum tempo que não faço ideia

Do que é fazer ideia

Existia um mundo lá fora, e a bem da verdade

Ele sempre foi inóspito

Mas aqui entre as quatro paredes

- branco gelo, gélido concreto-

Até que havia segurança e aconchego

Que eu podia chamar de lar

O lar de um abraço apertado

Eu podia morar naquele abraço

Protegido por quatro paredes

E tudo isso era tão cálido

Tudo isso era tão sólido

que as paredes ganhavam cor.

Hoje não dá pra saber

se estou pisando na areia molhada da praia em um dia ensolarado,

Ou tropeçando inexoravelmente

em direção ao abismo,

Ou só caminhando a esmo

Tateando no escuro

à procura de algum sentido onde talvez

não haja nenhum

(A mente, confusão).

 

E o tempo, ao invés de ajudar

De andar pra frente

Como sempre, inevitavelmente

(mesmo que fosse ilusão,

mesmo que talvez fosse apenas a minha percepção)

Agora apenas se mantém

em constante suspensão.

E eu acordo todo dia

nesse dia da marmota

 

Peito

combustão

E esta escrita agoniada

mariposas em revoada.


#carentena

 

 


Você - sim, você mesmo! - pessoa ultra-sensível, está como eu ainda mais sensível com toda essa situação que estamos vivendo?!

É uma pergunta retórica, obviamente.

Estou à beira das lágrimas o tempo todo, mas nem sempre é de tristeza não, às vezes é de emoção, às vezes raiva, às vezes até de amor, às vezes acho alguma coisa aparentemente banal tão ridiculamente bonita - uma música, um bouganville vermelho salpicado de borboletas amarelas e banhado pelo sol, o vôo de uma gaivota, meu filho se tornando cada dia mais adulto... e me permito chorar de beleza. Mesmo sabendo que há tanta feiura no mundo, a beleza é algo que me toca profundamente, e vira chaves e liga disjuntores e aciona válvulas no meu córtex cerebral. Rola uma festa aqui dentro todos os dias - embora às vezes estranha, com gente esquisita... é bonita, é bonita e é bonita. Pode durar um segundo, o tempo de um suspiro, do bater de asas de uma andorinha africana ou européia, ou de um abraço furtivo em tempos de pandemia.

Na verdade sempre fui um pouco assim, mas agora todas as emoções estão amplificadas de uma forma que nem sei como lidar... Junta nesse pacote depressão e ansiedade - essas sim as epidemias mais difíceis de combater da contemporaneidade, por necessárias que são à manutenção do status quo - e a falta de perspectiva geral e temos uma receita indigesta a tragar... Como vocês tem lidado com esse emocional todo fudido e mal pago?! hahahaha!

Pois bem, eu também rio, tento manter a leveza, que é pra não pirar de vez, que não posso me dar a esse luxo. Aliás, posso dizer que tenho rido talvez quase na mesma proporção com que tenho chorado. É bipolar ela, tadinha. Vou bebendo da loucura libertadora pequenas doses homeopáticas. E assim segue a montanha-russa, que ela pode até desacelerar, mas parar mesmo...

Eu tento escrever (poderia estar melhor), meditar, malhar, aprender violão (poderia estar BEM melhor), e principalmente tento não me julgar, não me culpar (nessa parte cês podem notar que poderia estar melhor também), e só julgar as atitudes alheias na medida do entendimento de que não somos à prova de falhas, mas precisamos também estar dispostos a evoluir e aprender. Humildade, sem servidão. Perspectiva. Eu tomo clonazepam, sad but true, mas é o que tem pra hoje. Tenho feito várias reflexões a respeito de muitas coisas, de atitudes minhas, dos outros, do que realmente importa em nossa passagem meteórica pela existência, mas isso fica pra outra hora. Resistir a me entregar completamente ao niilismo ainda é um exercício complexo.

Por outro lado, tenho me sentido bonita, amada, acolhida (na maior parte do tempo). Tenho me sentido mais conectada aos ciclos da natureza e ao meu eu mais interior, o que na minha percepção me dá uma espécie de superpoder com o qual ainda não sei lidar direito. Minha intuição anda afiadíssima, portanto não brinca comigo - que eu não ando só, só ando em boa companhia. Mesmo que seja a canção, o violão, a poesia. Lillith, a serpente, Kundalini ainda adormecida mas vamos dar um jeito de acender, e ascender - nem que seja uma faísca. Embora não deixe de reverenciar o sol, sigo mesmo é a lua e me re-conecto com minha energia feminina ancestral. Meu canto com ela compactua.

Por outro lado, muitas vezes eu só quero implodir, sumir e virar pó de estrelas espalhado pelo cosmos mesmo, ou passarinho, ou gato preto, ou qualquer coisa que não sei bem que... Mas quero ouvir (ou seria melhor dizer "ler"?!), há aqui um lugar de escuta (ou seria melhor dizer "leitura"?!), que aqui tudo vira textão também, que coisa. Lá vem a loka do textão (sou).



Não é pro meu TCC

é só pra falar de mim

e pra saber de você

na mesma proporção.



#carentena

(imagem: "stuck on my head" por motymotymoty)

 

quinta-feira, 17 de setembro de 2020

Fragmentada

 Eu quero falar duzôto aí eu digo pra mim mesma "deixa uzôto" e aí mim mesma responde pra eu "mas uzôto é escroto" e aí eu digo pra mim mesma "olha pra você" mim mesma pra eu "tô olhando... mas e o uzôto???" ambas se calam porque não sabem a resposta.