sexta-feira, 23 de outubro de 2020

 



Alma

convulsão

 

A vida é tão maior

E além

dessas quatro paredes

que me cercam

e me encerram em mim mesma

bem mais do que eu gostaria.

Encerram meu corpo

(E a alma em convulsão)

 

Confesso que o que tenho mais saudade

é dos abraços

Mas também tenho um medo danado

De não conseguir mais me soltar no mundo

De me fechar pra sempre nesse universo de brancura infinita

Paredes branco gelo, gélido concreto

Inferno de Sartre

Só que os outros moram TODOS dentro de mim

Que prendo eternamente na garganta

esse grito impossível.

 

Mente

confusão

 

Já há algum tempo que não faço ideia

Do que é fazer ideia

Existia um mundo lá fora, e a bem da verdade

Ele sempre foi inóspito

Mas aqui entre as quatro paredes

- branco gelo, gélido concreto-

Até que havia segurança e aconchego

Que eu podia chamar de lar

O lar de um abraço apertado

Eu podia morar naquele abraço

Protegido por quatro paredes

E tudo isso era tão cálido

Tudo isso era tão sólido

que as paredes ganhavam cor.

Hoje não dá pra saber

se estou pisando na areia molhada da praia em um dia ensolarado,

Ou tropeçando inexoravelmente

em direção ao abismo,

Ou só caminhando a esmo

Tateando no escuro

à procura de algum sentido onde talvez

não haja nenhum

(A mente, confusão).

 

E o tempo, ao invés de ajudar

De andar pra frente

Como sempre, inevitavelmente

(mesmo que fosse ilusão,

mesmo que talvez fosse apenas a minha percepção)

Agora apenas se mantém

em constante suspensão.

E eu acordo todo dia

nesse dia da marmota

 

Peito

combustão

E esta escrita agoniada

mariposas em revoada.


#carentena

 

 


Você - sim, você mesmo! - pessoa ultra-sensível, está como eu ainda mais sensível com toda essa situação que estamos vivendo?!

É uma pergunta retórica, obviamente.

Estou à beira das lágrimas o tempo todo, mas nem sempre é de tristeza não, às vezes é de emoção, às vezes raiva, às vezes até de amor, às vezes acho alguma coisa aparentemente banal tão ridiculamente bonita - uma música, um bouganville vermelho salpicado de borboletas amarelas e banhado pelo sol, o vôo de uma gaivota, meu filho se tornando cada dia mais adulto... e me permito chorar de beleza. Mesmo sabendo que há tanta feiura no mundo, a beleza é algo que me toca profundamente, e vira chaves e liga disjuntores e aciona válvulas no meu córtex cerebral. Rola uma festa aqui dentro todos os dias - embora às vezes estranha, com gente esquisita... é bonita, é bonita e é bonita. Pode durar um segundo, o tempo de um suspiro, do bater de asas de uma andorinha africana ou européia, ou de um abraço furtivo em tempos de pandemia.

Na verdade sempre fui um pouco assim, mas agora todas as emoções estão amplificadas de uma forma que nem sei como lidar... Junta nesse pacote depressão e ansiedade - essas sim as epidemias mais difíceis de combater da contemporaneidade, por necessárias que são à manutenção do status quo - e a falta de perspectiva geral e temos uma receita indigesta a tragar... Como vocês tem lidado com esse emocional todo fudido e mal pago?! hahahaha!

Pois bem, eu também rio, tento manter a leveza, que é pra não pirar de vez, que não posso me dar a esse luxo. Aliás, posso dizer que tenho rido talvez quase na mesma proporção com que tenho chorado. É bipolar ela, tadinha. Vou bebendo da loucura libertadora pequenas doses homeopáticas. E assim segue a montanha-russa, que ela pode até desacelerar, mas parar mesmo...

Eu tento escrever (poderia estar melhor), meditar, malhar, aprender violão (poderia estar BEM melhor), e principalmente tento não me julgar, não me culpar (nessa parte cês podem notar que poderia estar melhor também), e só julgar as atitudes alheias na medida do entendimento de que não somos à prova de falhas, mas precisamos também estar dispostos a evoluir e aprender. Humildade, sem servidão. Perspectiva. Eu tomo clonazepam, sad but true, mas é o que tem pra hoje. Tenho feito várias reflexões a respeito de muitas coisas, de atitudes minhas, dos outros, do que realmente importa em nossa passagem meteórica pela existência, mas isso fica pra outra hora. Resistir a me entregar completamente ao niilismo ainda é um exercício complexo.

Por outro lado, tenho me sentido bonita, amada, acolhida (na maior parte do tempo). Tenho me sentido mais conectada aos ciclos da natureza e ao meu eu mais interior, o que na minha percepção me dá uma espécie de superpoder com o qual ainda não sei lidar direito. Minha intuição anda afiadíssima, portanto não brinca comigo - que eu não ando só, só ando em boa companhia. Mesmo que seja a canção, o violão, a poesia. Lillith, a serpente, Kundalini ainda adormecida mas vamos dar um jeito de acender, e ascender - nem que seja uma faísca. Embora não deixe de reverenciar o sol, sigo mesmo é a lua e me re-conecto com minha energia feminina ancestral. Meu canto com ela compactua.

Por outro lado, muitas vezes eu só quero implodir, sumir e virar pó de estrelas espalhado pelo cosmos mesmo, ou passarinho, ou gato preto, ou qualquer coisa que não sei bem que... Mas quero ouvir (ou seria melhor dizer "ler"?!), há aqui um lugar de escuta (ou seria melhor dizer "leitura"?!), que aqui tudo vira textão também, que coisa. Lá vem a loka do textão (sou).



Não é pro meu TCC

é só pra falar de mim

e pra saber de você

na mesma proporção.



#carentena

(imagem: "stuck on my head" por motymotymoty)