Pessoas não podem viver aprisionadas assim. Ninguém deveria viver encarcerado, inclusive dentro da própria mente, do próprio ego, essa grande bola de ferro que nos prende à superfície e nos impede de voar. Tipo assum preto cazasinha cortada, é nóis.
Tá tudo bem. Tá tudo bem. Eu repito sempre pra me convencer que tá tudo bem. Só tem uns dias que são mais difíceis que os outros. Um dia após o outro, um dia de cada vez. Dizem os mantras, os astros, conselhos, se dane o evangelho, garantem os orixás. Mas é a montanha-russa, tá ligado?! Ela não para nunca, é uma porra dum Snowpiercer sem o high tech, só o teco-teco mesmo (sem spoilers, fazenufavor, ainda não vi a temporada nova). A vida no agora é a montanha-russa do Tivoli com 1001 carrinhos e geral segurando o fôlego antes daquele loop onde a gente vomita igual a mina do Exorcista, e ainda por cima vomita rosa de tanto picolé Frutilly que bem que minha mãe dizia pra não comer tanto, mas eu sempre comia. Sempre contestando autoridade. O loop onde o mundo vira de ponta-cabeça de vez, onde a vida capota mais que Katamari, porque ele vem, ah meus amores, ele SEMPRE vem. A voz do anjo sussurrou no meu ouvido: “enche o pulmão de ar, filha da puta! LABAXÚRIA CANTARARAMÁS!” (confesso que essa última parte eu não entendi). Mas é resistência que chama?! Ou é subsistência?
Quando vc não sabe mais a diferença entre vertigem e tédio — ou quando sabe até demais — é porque a montanha-russa tá indo bem mais rápido do que você é capaz de suportar. Mas mesmo assim você é capaz. Engraçado isso, né?! Você tem que ser. Nessas horas você se descobre capaz de coisas que nunca imaginou. Tipo andar na corda bamba segurando uma sombrinha numa mão e rodando um prato em cima de um pauzinho na outra. E que se pá você nem gostaria de ser capaz de tanto malabarismo, mas tem outro jeito?!
Tipo contar os dias, mesmo sem saber quando termina, e ainda assim continuar contando e crendo que sim, tudo é passageiro — menos o motorista e o cobrador (sim, Tio do Pavê, me deixa que hoje eu não tô inspirada).
Nenhuma interação virtual substitui de verdade um abraço, daqueles que te envolvem e dão um quentinho no coração, aquela vontade de morrer naquele abraço, saca?! O toque, o calor e a textura da pele. O cheiro. Cês sabem exatamente do que eu tô falando.
Sabe o tipo de coisa que a gente valoriza real quando fica escassa? Pois é. Quando a gente tem pouco e queria ter muito, e eu tô falando de sentimento, de afeto, de calor humano, não é de dinheiro não. Dinheiro só é importante porque é com ele que a gente compra drogas, viaja pra lugares paradisíacos e come sushi. Quer dizer, no mundo ideal né, porque no mundo real pra muitas pessoas só da pro feijão com farinha mesmo e olhe lá. Um maço de G comprado no trem (“mais de 4700 vitaminas para o seu pulmão”), uma Caninha da Roça, barrigudinha.
Pedaços de papel coloridos com números impressos definindo o tempo todo quem vive e quem morre. Definitivamente, esse mundo não é para amadores (com duplo sentido, por favor). “Fuck this shit, I’m going to Narnia” — mas do outro lado do armário só tem mesmo um compensado vagabundo cheio de cupim e traça cheirando a mofo e naftalina. Ser adulto dói.
A gente viajava. Agora a gente só espera. E vive um dia de cada vez, mesmo sendo um eterno dia da marmota.
Nunca na vida eu imaginei que usaria tanto, pensaria tanto, e principalmente sentiria tanto uma certa palavra, um conceito. Em todos esses anos nessa indústria vital, eu nunca imaginei que uma palavra tão triste e bonita, privilégio de lusófonos, ia ser ressignificada pra caber dentro dela todo esse turbilhão que eu sinto e sou agora.
MUITO PRAZER, MEU NOME É SAUDADE.
(Trilha sonora: American Heads, Flaming Lips. Deve ser patológico esse lance de achar a coisa mais linda quase tudo que é melancólico)
#carentena #adamavagabunda #mulheresqueescrevem #demasiadohumana